Os sons da humanidade – Edson Olimpio Oliveira–Crônicas & Agudas–03 Fevereiro 2015

 

2015 – 02 – 03 Fevereiro – Sons da humanidade – Edson Olimpio Oliveira – Crônicas & Agudas – Jornal Opinião

 

Sons da humanidade

 

A

 necessidade é a mãe da criação. No mais de um milhar de textos publicados em jornal, o cronista esmiúça quadrantes de espaços e de temas que possam fazer o leitor viajar, deleitar-se, relaxar, enfurecer-se até, mas sempre estimular para que seus neurônios trabalhem. Encantamo-nos com os sons das aves. Estuda-se intensamente a linguagem dos golfinhos e assim de tantos outros seres da criação. Entretanto muitos se sentem perturbados em falar ou tratar de sons espontâneos como os produzidos voluntariamente ou não pelo nosso corpo e que são marcas da nossa humanidade. E todos os sons são tão naturais quanto o choro do recém-nascido e o suspiro terminal do moribundo. Do início ao fim e em todos os momentos da vida.

 

Cr & Ag

 

Estávamos no sofá vendo tevê, eu e minha neta Ana Luiza, ela com 4 anos: – vovozinho, a minha barriguinha está com fome! – haja encantamento. Alegrias como somente as crianças produzem. Os roncos da sua barriguinha falavam-lhe – “estou com fome”. Ronca-se ao dormir e quantos outros roncos fazemos! São as vozes corporais que se desnudam em que exercita a meditação. Um magrão de nome Ivécio, lá da minha distante adolescência, emitia arrotos que se ouviam em toda a praça da Borracheira. Outro dia, no banheiro de um posto de gasolina de margem de rodovia, uma criatura gemia e soltava flatos enclausurado naquela solitária latrina. Ninguém geme igual ao outro. Mesmo por dor. “Geme-se sem sentir dor”, diz a música, assim como as palavras vão do “Ah! My God! Oh yes!” ao “vai que é tua Taffarel”. Os sons emitidos na relação amorosa aos sons da batalha pela sobrevivência espelham os sentimentos e o espírito da pessoa.

 

Cr & Ag

 

Somos submissos a um som supremo – o batimento cardíaco. Sonhos do poeta e preocupações do médico, ali está esse senhor símbolo da vida e do amor. Também do desamor em “quem não tem coração”, como o “cruel presidente da Indonésia que não perdoou o brasileiro que só era traficante”. O estalar das juntas gastas ou endurecidas não tem nenhuma mística como do tambor cardíaco que acompanha e emoldura nossas emoções. Da mãe ao ver o filho retornar, ao amante entregue aos braços da amada. Nesses momentos, pouco se escuta os outros sons ou ruídos na nossa existência passageira ou longa enquanto durar. Sons da trivialidade necessária do escovar de dentes, da escova nos cabelos e sua eletricidade aos gargarejos, ali se revela a higiene como os adequados cuidados consigo e com o entorno.

 

Cr & Ag

 

Se “ninguém suspira como ela” (Ops, um cacófato!) os suspiros anexam uma enciclopédia de sentimentos e momentos. Suspirasse por cansaço, fadiga, saudade, melancolia e outros até interrompidos por um soluço. Crises de soluços já levaram muitas pessoas aos médicos, plantões e à forca nos tempos mais remotos. Há ainda quem morra de soluço debaixo da cama ou nos roupeiros e armários. Eis que muitos sons são acompanhados por odores agradáveis ou fedores insuportáveis. Momentos e necessidades, mas sons da nossa humanidade.

Centauro

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